A Ancestralidade como Diferencial Competitivo: O Empreendedorismo Feminino na Moda Afro-brasileira
O empreendedorismo feminino no Brasil tem encontrado na ancestralidade um poderoso alicerce para a construção de negócios autênticos e rentáveis. A união entre saberes tradicionais e o mercado contemporâneo tem gerado iniciativas transformadoras, especialmente no setor de moda. Como exemplo inspirador, temos a história de Érika Santos, que conseguiu transformar sua experiência como yalorixá e psicóloga em um negócio próspero de moda ancestral, investindo apenas R$ 2 mil inicialmente.
A jornada de Érika não é um caso isolado. Representa um movimento crescente de mulheres, especialmente negras, que estão resgatando conhecimentos tradicionais e transformando-os em oportunidades de negócio. Essa conexão entre o terreiro e o mercado é mais do que uma estratégia comercial – é uma forma de preservação cultural e empoderamento econômico.
No cenário paulistano, carioca e baiano, onde as tradições de matriz africana são fortemente presentes, esse tipo de empreendimento tem encontrado terreno fértil. Mulheres de terreiros, muitas vezes invisibilizadas economicamente, estão descobrindo no empreendedorismo uma forma de valorizar seus conhecimentos enquanto geram renda para suas famílias e comunidades.
A acessibilidade do investimento inicial é um dos pontos mais relevantes desse modelo de negócio. Como demonstrado pela experiência de Érika Santos, com apenas R$ 2 mil é possível iniciar uma marca de moda étnica. Esse baixo capital inicial se deve, em grande parte, ao aproveitamento de recursos já disponíveis: o conhecimento ancestral, as técnicas artesanais transmitidas entre gerações e a rede de apoio comunitário que caracteriza os terreiros.
Para empreendedoras de São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador e outras capitais brasileiras, começar com pouco capital e escalar gradualmente tem sido uma estratégia viável. Muitas iniciam produzindo peças sob demanda, minimizando custos com estoque, e utilizam plataformas digitais para ampliar seu alcance sem a necessidade de um ponto comercial físico.
A formação acadêmica, quando aliada aos saberes tradicionais, potencializa ainda mais esses empreendimentos. No caso de Érika, sua formação em psicologia complementou sua vivência como yalorixá, permitindo uma compreensão mais profunda sobre como os elementos culturais podem dialogar com as necessidades e desejos do mercado contemporâneo. Essa interdisciplinaridade tem sido um diferencial significativo para empreendedoras que conseguem traduzir valores ancestrais em produtos e serviços relevantes para o consumidor atual.
O mercado de moda afro-brasileira tem registrado crescimento consistente nos últimos anos. Segundo dados da Alma Preta, o empreendedorismo negro no Brasil cresceu 56% em 10 anos, com destaque para iniciativas lideradas por mulheres. Este cenário abre oportunidades significativas para empreendedores que desejam investir em marcas que valorizam a estética e os saberes afro-brasileiros.
Em cidades como Salvador, berço de muitas tradições afro-brasileiras, marcas locais têm conseguido expandir seus negócios para o mercado nacional e até internacional, levando elementos da cultura baiana para consumidores que valorizam autenticidade e significado em suas escolhas de consumo. O mesmo fenômeno tem se replicado em comunidades tradicionais de Pernambuco, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Um aspecto fundamental desse movimento é a economia colaborativa que se estabelece nos terreiros e comunidades tradicionais. As mulheres dessas comunidades frequentemente se organizam em redes de apoio mútuo, compartilhando conhecimentos, ferramentas e oportunidades. Essa colaboração fortalece não apenas os negócios individuais, mas todo o ecossistema empreendedor local.
Em São Paulo, por exemplo, existem iniciativas como feiras de empreendedoras de matriz africana, onde o compartilhamento de espaços e clientes potencializa as vendas de todas as participantes. No Rio de Janeiro, cooperativas de costureiras e artesãs de comunidades tradicionais têm conseguido acessar mercados mais amplos através da união de forças.
A transformação de elementos culturais em diferenciais competitivos é talvez o aspecto mais estratégico desse tipo de empreendimento. Símbolos, cores, técnicas e narrativas ancestrais tornam-se não apenas características estéticas, mas valores que conectam marcas a consumidores cada vez mais interessados em produtos com história e significado.
Para empreendedoras do Nordeste, as rendas e bordados tradicionais ganham nova vida em peças contemporâneas. No Sudeste, técnicas de tecelagem e tinturaria natural praticadas em comunidades tradicionais são incorporadas a coleções que dialogam com as tendências atuais sem perder sua essência cultural.
Apesar das oportunidades, empreendedores negros no mercado de moda brasileiro enfrentam desafios significativos. O acesso limitado a crédito, a falta de representatividade em grandes eventos do setor e o racismo estrutural são barreiras que precisam ser constantemente enfrentadas. No entanto, soluções coletivas têm surgido para contornar esses obstáculos.
Em Salvador, Rio de Janeiro e São Paulo, redes de apoio a empreendedores negros oferecem mentorias, capacitações e acesso a investidores conscientes da importância de diversificar o ecossistema empreendedor brasileiro. Instituições como o Sebrae têm desenvolvido programas específicos para negócios culturais, reconhecendo seu potencial econômico e social.
A modernização da moda de matriz africana exige um delicado equilíbrio entre tradição e inovação. Estratégias bem-sucedidas incluem a adaptação de técnicas ancestrais a materiais contemporâneos, o diálogo entre estéticas tradicionais e tendências atuais, e o uso de tecnologias digitais para ampliar o alcance das marcas.
Empreendedoras de Minas Gerais, por exemplo, têm incorporado técnicas tradicionais de tecelagem a peças que atendem às necessidades do consumidor urbano. No Rio Grande do Sul, elementos da cultura afro-gaúcha ganham novas interpretações em coleções que respeitam as raízes enquanto dialogam com a contemporaneidade.
O impacto social desses empreendimentos culturais vai muito além do aspecto econômico. Ao fortalecer comunidades tradicionais, essas iniciativas contribuem para a preservação de saberes que poderiam se perder, para a valorização de identidades historicamente marginalizadas e para a construção de uma sociedade mais diversa e inclusiva.
Em comunidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia, o surgimento de empreendimentos baseados em saberes ancestrais tem criado oportunidades de trabalho e renda para pessoas que muitas vezes enfrentavam dificuldades de inserção no mercado formal. Além disso, essas iniciativas frequentemente reinvestem parte de seus lucros em projetos sociais locais, multiplicando seu impacto positivo.
A trajetória de mulheres como Érika Santos demonstra que a união entre ancestralidade e empreendedorismo pode ser não apenas viável, mas transformadora. Do terreiro para o mercado, essas empreendedoras estão reconstruindo narrativas, fortalecendo comunidades e provando que saberes ancestrais têm valor e lugar no mundo contemporâneo.
Para empreendedores e gestores que buscam autenticidade e diferenciação, o olhar para as tradições culturais brasileiras pode revelar oportunidades inexploradas. Como demonstra o crescimento do setor de moda afro-brasileira, o resgate e a valorização de nossa diversidade cultural não são apenas responsabilidade social, mas também estratégia de negócios inteligente e sustentável.
Referências:
Globoplay. (2025). Pequenas Empresas & Grandes Negócios: “Com R$ 2 mil e saber ancestral, mulher transforma roupas de terreiro em negócio”. https://globoplay.globo.com/pequenas-empresas-grandes-negocios/t/VCJ2YgTB5G/
Afro Presença. (s.d.). Moda afro-brasileira: empreendedorismo que veste identidade e cultura. https://afropresenca.com/moda-afro-brasileira-empreendedorismo-que-veste-identidade-e-cultura/
Sebrae. (s.d.). Negócios da cultura: como empreender com a identidade brasileira. https://sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/negocios-da-cultura-como-empreender-com-a-identidade-brasileira,302b9946926e2710VgnVCM1000004c00210aRCRD
Alma Preta. (s.d.). Empreendedorismo negro no Brasil cresce 56% em 10 anos. https://www.almapreta.com.br/editorias/brasil-e-mundo/empreendedorismo-negro-no-brasil-cresce-56-em-10-anos