Guerra Tarifária e Pequenos Negócios: Impactos e Estratégias para Empresários Brasileiros

Em um cenário econômico global cada vez mais interconectado, as tensões comerciais entre grandes potências econômicas repercutem diretamente na vida dos empreendedores brasileiros. A guerra tarifária entre os Estados Unidos e outros países, que ganhou destaque nos últimos meses, já era vista com preocupação pelos pequenos negócios brasileiros mesmo antes do anúncio oficial das medidas pelo governo norte-americano.

Uma sondagem realizada pelo Sebrae em parceria com a Fundação Getúlio Vargas em junho deste ano revelou que mais de 60% dos donos de pequenos negócios já tinham conhecimento prévio sobre a possibilidade dessas medidas protecionistas. A percepção predominante entre os empresários brasileiros é negativa, especialmente para o setor de comércio, onde 50,7% dos entrevistados preveem consequências desfavoráveis.

“A leitura que fazemos da pesquisa é que não há nenhum efeito positivo no processo provocado pela guerra tarifária”, afirmou Décio Lima, presidente do Sebrae. Segundo ele, “é hora de mostrar a grandeza econômica brasileira. O Brasil é muito maior do que um agravante de fronteiras”.

Impactos no Comércio Local e nas Cadeias Produtivas

As medidas protecionistas tendem a afetar não apenas o comércio internacional direto, mas também as cadeias produtivas locais. Quando tarifas são impostas sobre produtos importados, o encarecimento desses itens pode gerar aumento de custos em diversas etapas da produção local. Em Minas Gerais, por exemplo, onde os pequenos negócios são responsáveis por 70% dos empregos gerados, qualquer interferência nas cadeias produtivas pode ter efeito multiplicador negativo na economia regional.

Especialistas apontam que os setores mais sensíveis são aqueles que dependem de insumos importados ou que têm como destino principal o mercado norte-americano. Empresas inseridas em cadeias globais de valor tendem a sentir os efeitos de forma mais imediata, enquanto negócios voltados exclusivamente ao mercado interno podem sofrer impactos indiretos através da oscilação cambial e mudanças nos preços de commodities.

Resiliência e Crescimento dos Pequenos Negócios

Apesar do cenário desafiador, os pequenos negócios brasileiros vêm demonstrando notável resiliência. No primeiro semestre de 2025, foram abertos 2,6 milhões de pequenos negócios no país. A abertura de novos MEIs (Microempreendedores Individuais) cresceu 13,2% em relação a junho de 2024, enquanto as micro e pequenas empresas registraram aumento de 3,8%.

Além da expressiva geração de novos empreendimentos, as MPEs foram responsáveis por mais de 60% dos postos de trabalho criados no país até maio deste ano. Esse desempenho reforça o papel fundamental dos pequenos negócios como motor da economia brasileira, mesmo em tempos de instabilidade comercial internacional.

O faturamento das micro e pequenas empresas também mostrou crescimento significativo no primeiro semestre, com aumento de 10,6% em comparação ao mesmo período do ano anterior. Esse resultado, divulgado pelo Sebrae, indica que os pequenos negócios estão encontrando formas de se adaptar e prosperar mesmo diante de incertezas no cenário internacional.

Exportações e Distribuição Geográfica

Um dado relevante para compreender a exposição dos pequenos negócios brasileiros à guerra tarifária é a distribuição geográfica de suas exportações. Atualmente, 68% das exportações dos pequenos negócios são destinadas às Américas, sendo 28% para a América do Sul, 24% para a América do Norte e 7% para a América Central e Caribe.

Essa concentração representa tanto uma oportunidade quanto um risco. Por um lado, a proximidade geográfica facilita logística e reduz custos; por outro, torna os pequenos exportadores mais vulneráveis a medidas protecionistas adotadas por parceiros comerciais na região, especialmente pelos Estados Unidos.

Nos últimos 10 anos, houve um crescimento significativo no acesso dos pequenos negócios ao mercado internacional. O número de empreendedores que vendem produtos e serviços para outros países aumentou 120%, enquanto as médias e grandes empresas cresceram apenas 29% no mesmo período. Atualmente, os pequenos negócios representam 41% do total de empresas exportadoras brasileiras, embora movimentem cerca de 0,9% do montante de recursos.

Setores Líderes em Exportação

De acordo com levantamento do Sebrae, em 10 anos foi registrado um crescimento de 152% nos valores comercializados por pequenos negócios. Em 2023, esse segmento movimentou US$ 2,8 bilhões, o melhor resultado registrado em anos anteriores a 2020, sendo superado apenas pelas exportações realizadas em 2021 e 2022.

Os principais setores exportadores entre os pequenos negócios são:

  1. Indústria de transformação: responde por 72,4% dos valores exportados, com crescimento de 128% entre 2013 e 2023
  2. Pequenas propriedades rurais: representam 18,5% das exportações, com crescimento expressivo de 336% em 10 anos
  3. Indústria extrativa: corresponde a 4,4% do montante exportado, com crescimento de 309% no período

Este perfil setorial indica que, apesar de sua menor participação no volume total de exportações, os pequenos negócios brasileiros estão gradualmente conquistando espaço no mercado internacional, com ênfase em produtos com maior valor agregado.

Estratégias de Adaptação

Diante do cenário de incertezas no comércio internacional, especialistas e entidades como o Sebrae recomendam algumas estratégias para os pequenos negócios:

  1. Diversificação de mercados: reduzir a dependência de um único mercado internacional, buscando oportunidades em diferentes regiões geográficas
  2. Fortalecimento do mercado interno: intensificar a presença no mercado doméstico, aproveitando a escala do mercado consumidor brasileiro
  3. Capacitação e inovação: investir em qualificação técnica e inovação para agregar valor aos produtos e serviços oferecidos
  4. Participação em políticas setoriais: acompanhar e participar de iniciativas governamentais de apoio ao comércio exterior
  5. Associativismo: buscar parcerias com outros pequenos negócios para ganhar escala e reduzir custos

Em São Paulo e Minas Gerais, estados com forte presença de pequenos exportadores, programas específicos de capacitação têm sido implementados para ajudar empresários a navegar pelo complexo cenário do comércio internacional em tempos de guerra tarifária.

Papel do Sebrae e Perspectivas Futuras

O Sebrae tem desempenhado papel fundamental no apoio aos pequenos negócios neste contexto desafiador. Além do monitoramento constante do cenário econômico através de pesquisas e sondagens, a entidade oferece programas de capacitação específicos para internacionalização de pequenas empresas.

“Nós precisamos acreditar em nós mesmos, na nossa economia, na capacidade de negociação do atual governo, na nossa capacidade de resiliência e de gerar mudanças”, afirmou Décio Lima, destacando a importância de uma postura proativa diante dos desafios.

As perspectivas para os próximos meses dependem significativamente da evolução das negociações comerciais internacionais e das medidas que serão efetivamente implementadas. Contudo, a trajetória recente dos pequenos negócios brasileiros sugere capacidade de adaptação mesmo em cenários adversos.

A diversificação de mercados e a busca por inovação parecem ser os caminhos mais promissores para minimizar os impactos negativos da guerra tarifária. Ao mesmo tempo, o fortalecimento de políticas públicas de apoio ao empreendedorismo e à internacionalização de pequenas empresas pode ser determinante para transformar desafios em oportunidades de crescimento sustentável.

Referências:

  1. Sondagem “A guerra tarifária entre os Estados Unidos e outros países”, Sebrae/FGV, 2025.
  2. “Pequenos negócios são responsáveis por 70% dos empregos gerados em Minas Gerais”, Agência Minas, 2024.
  3. “Sebrae: faturamento das micro e pequenas empresas cresce 10,6% no primeiro semestre”, Agência Sebrae, 2025.
  4. “Impacto da guerra comercial EUA-China no Brasil”, Correio Braziliense, 2019.