A violência sexual contra meninas no Brasil é alarmante, com 87% da população reconhecendo-a como a principal violação. Uma pesquisa revela não apenas a gravidade desse problema, mas também a percepção de vulnerabilidades relacionadas ao ambiente digital e outras formas de violência, como a adultização precoce. É urgente que sociedade, famílias e instituições se unam na educação e na criação de proteções, buscando um futuro mais seguro para nossas meninas.

A violência sexual emerge como a principal forma de violação contra meninas no Brasil, representando uma realidade alarmante que exige atenção imediata da sociedade. Uma pesquisa realizada pelo Instituto QualiBest, que ouviu 824 pessoas de todas as classes sociais e regiões do país, revelou que 87% dos brasileiros reconhecem a violência sexual como o tipo de violação que mais vitima meninas, sendo considerada por 43% como a forma de violência mais comum no território nacional.

A pesquisa “Percepções sobre violência e vulnerabilidade de meninas no Brasil” analisou diferentes formas de violência, incluindo física, psicológica e online, que abrange casos de cyberbullying, assédio e exposição de imagens na internet. Os dados coletados por meio de formulário online incluíram respostas de 433 mulheres e 381 homens, proporcionando uma visão abrangente sobre como a população brasileira percebe essas questões.

Os dados revelam um cenário preocupante que vai além da violência sexual direta. A adultização precoce de meninas foi identificada por 90% dos respondentes como uma forma de violência, sendo que 61% a consideram totalmente uma violação de direitos. Esta percepção massiva demonstra uma conscientização crescente sobre práticas que historicamente eram normalizadas na sociedade brasileira.

Ana Nery Lima, especialista em gênero e inclusão da Plan Brasil, chama atenção para outras formas de violência que recebem menos reconhecimento público: apenas 36% mencionaram a falta de acesso à educação, 43% o casamento infantil, 46% o trabalho infantil e 48% a negligência. Esta disparidade no reconhecimento é preocupante, pois diferentes tipos de violência frequentemente se interconectam, criando ciclos de vulnerabilidade que podem culminar em violência física e até feminicídio.

O ambiente digital se tornou um território de particular vulnerabilidade para meninas. A pesquisa revelou que 92% dos respondentes consideram que a internet e as redes sociais aumentam significativamente os riscos enfrentados por meninas. Esta percepção se baseia em dados concretos: 51% dos participantes relataram que seus filhos menores de 18 anos mantêm perfis nas redes sociais, principalmente no Instagram, WhatsApp, TikTok e YouTube.

O comportamento dos pais no ambiente digital também merece atenção. Entre os 359 entrevistados que responderam sobre exposição de filhos online, 74% afirmaram publicar fotos de crianças e adolescentes nas redes sociais. Embora 27% o façam apenas em perfis fechados e 33% de forma controlada e rara, 6% publicam em perfis abertos com restrições limitadas, e 8% fazem isso sem qualquer precaução especial.

Uma descoberta surpreendente da pesquisa foi a percepção de que 83% da população considera a internet mais perigosa para meninas do que suas próprias casas, mencionadas por apenas 33% dos respondentes. Esta percepção contrasta drasticamente com as estatísticas oficiais, que consistentemente mostram que a maioria das violências de gênero contra meninas e mulheres ocorre em residências, perpetrada por conhecidos, parentes ou companheiros.

Juliana Cunha, diretora da SaferNet Brasil, explica que essa percepção distorcida está “arraigada cultural e profundamente na sociedade brasileira”, fazendo com que os lares sejam considerados menos ameaçadores que ruas, bairros ou transporte público. Ana Nery Lima complementa que existe uma tendência de imaginar o risco como vindo de “adultos estranhos”, quando na realidade muitas violações são cometidas por pessoas da mesma idade ou do círculo de confiança das vítimas.

Uma nova ameaça digital que tem se expandido rapidamente é a criação de deepfakes sexuais envolvendo meninas. Esta técnica utiliza inteligência artificial generativa para misturar o rosto de uma garota com o corpo de outra pessoa em contextos sexuais, ou criar imagens completamente sintéticas. A SaferNet Brasil documentou 16 casos em escolas de dez unidades federativas, identificando 72 vítimas e 57 agressores, todos menores de 18 anos.

Os estados com maior incidência de deepfakes sexuais incluem Alagoas, Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Preocupantemente, quase todos os casos ocorreram em instituições privadas de ensino, sugerindo que o acesso à tecnologia pode estar facilitando essas práticas violentas.

A ausência de monitoramento oficial sobre deepfakes sexuais representa uma lacuna crítica nas políticas de proteção. A SaferNet destaca que não há acompanhamento por parte das autoridades brasileiras sobre a incidência desses crimes, nem informações sobre o progresso das investigações, dificultando a compreensão da real dimensão do problema.

A educação surge como ferramenta fundamental para enfrentar essa realidade. É essencial que escolas, famílias e comunidades trabalhem juntas na prevenção e conscientização sobre diferentes formas de violência contra meninas. O reconhecimento adequado dos tipos de violação é crucial para que as vítimas possam denunciar apropriadamente e receber o suporte necessário.

A responsabilização de adultos que exploram financeiramente a exposição de meninas online ou as colocam em risco no ambiente digital recebe apoio de 92% dos participantes da pesquisa, indicando um consenso social sobre a necessidade de proteção mais rigorosa no espaço virtual.

A sensação de maior vulnerabilidade atual também é significativa: 60% dos respondentes acreditam que as meninas estão “muito mais vulneráveis” hoje do que há uma década, percepção que se intensifica entre pais e mães (69%). Esta percepção crescente de risco exige respostas proporcionais da sociedade e das instituições.

A realidade revelada pela pesquisa demanda ação coordenada entre sociedade, famílias, educadores e autoridades. É fundamental desenvolver estratégias abrangentes que incluam educação digital, fortalecimento de redes de proteção, capacitação de profissionais e criação de canais seguros para denúncias. Somente através de esforços conjuntos será possível criar um ambiente mais seguro para meninas brasileiras, tanto no mundo físico quanto no digital.

Referências

https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/brasil/violencia-sexual-e-violacao-que-mais-vitima-meninas-aponta-pesquisa/
https://www12.senado.leg.br/radio/1/noticia/2023/05/17/violencia-sexual-contra-criancas-e-adolescentes-panorama-no-brasil
https://www.politize.com.br/estupro-de-vulneravel/
https://forumseguranca.org.br/anuario-brasileiro-seguranca-publica/